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Uma Breve Reflexão Sobre Consciência de Classe

  • Foto do escritor: Dione Castro
    Dione Castro
  • 15 de mai. de 2020
  • 8 min de leitura

Democracia x Oligarquia



Ribeirão Corrente – SP, 10 de Maio de 2020.


Imagem da internet. Direitos autorais a quem de direito.



O formato de Estado que conhecemos na pele, é aquele que há uma classe dominante no poder e, cria um mecanismo governamental para beneficiar uma “minoria” que não é a classe trabalhadora ou marginalizada – maioria. Mas, sim a “minoria” burguesa, sendo esta a detentora da maior parte da riqueza gerada. É verdade que se tem um Estado constituído de direitos, republicano e democrático formalmente, porém na prática não é para todos, e sim para poucos. Pouquíssimos.

Quer um exemplo? O servente, tampouco o pedreiro que usou de sua força de trabalho para construir uma universidade pública, não tem condições de dar ensino de alto padrão a seu filho para disputar uma vaga com o filho do burguês naquela mesma universidade construída por suas próprias mãos. Raras são as exceções. Aí eles dizem: “meritocracia”. Eu digo: Barbárie. Apesar da educação ser um direito de caráter fundamental e universal, não é o mesmo que educação de qualidade. A educação de qualidade não é para todos, ela é de fato para aquele grupo dominante. Quando dizem ao contrário é discurso para “inglês ver”. Papinho de liberal barato.

Ora, aquilo que o Estado oferece, grande parte do que consumimos em termos de conhecimento é sob a ótica dos “grandes homens”. Quais “grandes homens” são estes? Quem são os “pequenos”? Eles são “grandes”, por quê? Simples, o saber histórico nos mostra que esses “grandes agentes do progresso”, são os poderosos dominantes, que tem seu poder pautado na exploração dos “pequenos”. Aliás, há um pacto senhoril feito somente com a ideia da existência do “pequeno”. É o prisma da ideologia dominante.

A população é mal informada, há um desprestigio pela política, pouco interesse, uma alienação total. Muitos aproveitam desta alienação de modo a pensar em políticas públicas direcionadas ao grupo elitizado, além do fato de servirem como massa de manobra. Assim, não há nenhum interesse em desenvolver esta massa, pois fazem parte de um coeficiente, o eleitoral.

Tudo começa pelo desconhecimento dos conceitos de classes sociais e formação étnica do nosso próprio país. Assim, inibe qualquer anseio de luta de classe iniciada pelas minorias, pois torna-se uma sociedade desorganizada politicamente. Uma questão que precisa ser esclarecida é a definição de classes sociais sob a perspectiva do gênero capital e suas espécies exposta por Pierre Bourdieu.

Há uma verdadeira distorção frente ao entendimento deste importante conceito, responsável por direcionar estudos e efeitos comportamentais na sociedade como um todo. Sobretudo, os efeitos e condutas das classes: dominante, média, trabalhadora e marginalizada. Mas, antes vamos refletir sobre o capital, de modo a compreender suas espécies.

A primeira vez que compreendi o termo capital e suas espécies expostas por Pierre Bourdieu, foi através do sociólogo brasileiro Jessé Souza. Temos uma visão ofuscada referente ao capital. O capital não é só poder econômico – não é só dinheiro – assim como compreendemos. O capital é também poder econômico. O termo capital trata-se de gênero, divido em espécies a saber: a) capital econômico; b) capital social; e c) capital cultural. Compreenderemos cada um destes conceitos e entenderemos a proposta de como se coloca cada classe em uma estrutura diferente da que estamos acostumados a ver.

O capital econômico é bastante conhecido entre a sociedade, pois vivemos em um Estado liberal, ocasião que se dá muito valor a políticas econômicas financeiras capitalistas na geração de riquezas, sobretudo no acumulo. Entende-se como capital econômico a forma de diferentes fatores de produção, tais como fábricas, terras e trabalho. Não só isso, é também o conjunto de bens econômicos como dinheiro, patrimônios e bens materiais acumulados, reproduzidos e ampliados através de estratégicas próprias de proprietários privados ou do Estado através de políticas econômicas públicas de incentivo.

Já o capital social seria a construção de contatos e influencias entre pessoas e grupos sociais. Via de regra, esta construção inicia no interior das redes familiares havendo inclusive uma determinada importância para o desenvolvimento escolar e cognitivo dos filhos daquelas famílias. Ainda, um outro momento de construção desta espécie de capital seria nas relações extrafamiliares. Ou seja, contatos fora do lar, principalmente no contexto econômico, de personalidades estatais, comunidades e grupos formais de expressão dominante ou gerenciador das classes dominantes tais como políticos, além dos informais – aqui a classe dominante que não sabemos quem são tais como donos de grandes empresas. Assim, Pierre Bourdieu define capital social:


[…] conjunto de recursos atuais ou potenciais que estão ligados à posse de uma rede durável de relações mais ou menos institucionalizadas de interconhecimento e de interreconhecimento ou, em outros termos, à vinculação a um grupo, como conjunto de agentes que não somente são dotados de propriedades comuns (passíveis de serem percebidas pelo observador, pelos outros ou por eles mesmos), mas também são unidos por ligações permanentes e úteis (BOURDIEU, 1998, p. 28).


Por fim o capital cultural, trata-se da construção do conhecimento, da práxis aderente aos procedimentos de aprendizagem seja por uma experiência ou através de acesso a uma educação que não é a vulgarmente conhecida por nós da classe trabalhadora e marginalizada. Trata-se de uma educação sofisticada que leva a apreciar e valorizar a cultura através de acesso a obra de artes, livros, dicionários, conhecimentos linguísticos, acesso a outros idiomas, instrumentos, máquinas, saber apreciar a culinária, bebidas, de modo a ter condições críticas de problematizar a complexidade da vida, além de arranjar soluções.

Pois bem, agora que entendemos cada espécie do gênero capital, indaga-se: qual o reflexo na compreensão e consciência de classe? Falar-se-á sobre as espécies de classe dominante, classe média, classe trabalhadora e classe marginalizada.

A classe dominante é composta por agentes que detém e controlam todo o processo de produção capitalista através da exploração da força de trabalho e tem enorme influência política ao ponto de direcionar o Estado para atender seus interesses particulares. Trata-se de uma minoria poderosa que vive em uma autossegregação. São detentores do capital econômico, capital social e capital cultural. Vivem em lugares inacessíveis as demais classes. São os banqueiros, empresários bilionários de multinacionais, fazendeiros latifundiários e, pessoas que não possuem nenhum meio de produção, mas participam como gerentes da classe dominante no sistema, assim como os políticos de alto clero. Trata-se do burguês.

São classe dominante, não simplesmente pelo poder econômico, mas sim por sua composição. O fato de ter 1 milhão na conta bancária não o torna membro desta classe. Pois, é preciso ter influência social, contatos com membros da alta casta, senso cultural apurado como saber apreciar um bom vinho, possuir e conhecer obras de arte, entender sobre arte, ter acesso as mais raras joias, ser educado nas melhores universidades do mundo, relacionar e casar-se entre membros da classe dominante, visitar lugares próprios inimagináveis etc.

Já a classe média é composta por aqueles que possuem um poder aquisitivo, possuem moradias – grande parte financiadas, possuem acesso a veículos através de créditos bancários, tem acesso ao consumo, porém não são donos do poder de produção, tampouco detentores das “especulações financeiras”. Apesar de ter como meta a acessão para classe dominante, porém não é tão simples. A classe média detém de uma parte do capital social e do capital cultural institucional. Tem acesso as universidades, via de regra, fazem parte do funcionalismo público na condição de magistrados, promotores de justiça além dos demais que ocupam papel executivo técnico dentro da república com altos salários - um parêntese importante é que não basta ser funcionário público deve-se compor os respectivos elementos do capital; e, de profissões tais como engenheiros, médicos, grandes advogados e, uma pequena categoria de empresário não milionário que gera riqueza para manutenção do poder aquisitivo.

A classe trabalhadora atualmente é composta pelo tradicional operário industrial, o trabalhador rural assalariado, os assalariados de serviços tais como os operadores de telemarketing, os que trabalham nos supermercados, a massa de trabalhadores que trabalham nos bancos – inclusive os gerentes, os trabalhadores terceirizados, os desempregados – estão nesta condição pelo capital, microempreendedores, os autônomos, empregados domésticos, os motoboys, os pequenos produtores rurais, também os que compõe a agricultura familiar, enfim, são todos aqueles que vendem sua força de trabalho tendo ou não carteira de trabalho assinada. Aqueles que possuem salários melhores têm acesso – limitado - ao capital cultural formal, tal como acesso a um curso superior, curso técnico e possível especialização técnica com assistência governamental, que pode-se estender a moradias, além de um reduzido acesso a microcréditos populares – quando há políticas públicas com este propósito.

Todo meio de geração e acumulo de riqueza aos dominantes advêm da exploração da força da classe trabalhadora. Por fim, a classe entendida como marginalizada, são aqueles aos quais não conseguem ter acesso aos direitos fundamentais básicos tais como a saúde, alimentação, moradia, educação básica e outros. Chamados de “marginais”, aqueles que estão a margem social periféricas.

Diante disto, cabe-me salientar que a definição de classe social através do potencial de consumo não é uma forma adequada de qualificação. Pois, como observado acima, há elementos de composição e, uma das formas que pode ajudar a perfurar o limite da classe trabalhadora para a classe média é o acesso ao capital cultural. Somente a educação de qualidade – leia-se educação crítica que forme cidadão - é capaz de dirigir uma possível acessão social.

Frisa-se que o termo trabalhador é gênero composto por duas espécies sendo a figura do empregador, que nem sempre é da classe dominante em decorrência de não obter o "capital pleno", e a figura do empregado. Este o direito trabalhista define que o empregado é aquele que vende a sua força de trabalho pessoalmente, com habitualidade, sendo subordinado ao empregador, recebendo em troca o salário. Perceba ambos são trabalhadores, mas não são todos empregados. Na relação de trabalho há o patrão e o empregado, e o que define sua classe são os elementos do capital.

Portanto, sinto muito em dizer, que há uma inversão de entendimento sócio cultural e político. Há aqueles que pensam ser da classe média, mas são na verdade da classe trabalhadora. Pois, não é o alto salário que determina uma classe. Defendem políticas de interesse da classe dominante, tendo a ilusão de um dia se tornar membro daquela determinada classe, porém não é possível. A classe média, por exemplo, nunca será classe dominante. É usada como massa de manobra na defesa dos interesses da classe dominante.

Na atual conjuntura, vemos muitos assalariados, microempresários, empresários não milionários, dizendo serem conservadores de direita. Ocasião em que não compreendem sua posição na sociedade. A direita, via de regra, defende questão não progressistas. O foco principal da direita – composta pela classe dominante – é o acumulo máximo de riqueza através da exploração das demais classes, principalmente da classe trabalhadora, através da proteção do livre mercado e Estado mínimo.

O Estado tem um papel determinante de assistência as demais classes sociais, principalmente a classe trabalhadora e marginalizada. O Estado é quem define os direitos fundamentais aos trabalhadores, como acesso a saúde, os direitos trabalhistas, as assistências sociais, etc. Deste modo, falta o membro da classe trabalhadora compreender seu contexto social e sua posição enquanto classe social. Todo membro da classe trabalhadora e marginalizado, tendo consciência defenderia as ideias progressistas de esquerda. Assim, rompendo com a burguesia através da luta de classes.

Todavia, o fato é que a nossa democracia está a serviço de um grupo majoritário que a tempos trabalham para a manutenção dos privilégios. Deste modo, torna-se uma democracia que não está em detrimento do povo, mas pela manutenção da oligarquia. Em outras palavras, não basta derrotar os gerentes da classe dominante, é preciso enfrentar e derrotar a elite brasileira que é nociva e exploradora. Trata-se da herança genética do imperialismo.


REFERÊNCIAS:


BOURDIEU, Pierre. Les trois états du capital culturel. Actes de la recherche en sciences sociales, Paris, n. 30, nov. p. 3-6, 1979.


BOURDIEU, Pierre. Escritos de educação. Petrópolis: Vozes, 1998.






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